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Uma nova formulação ativa de ferro para anemia por deficiência de ferro: resultados do ensaio ACCESS

Uma nova formulação oral de ferro conjugado com N-aspartil-caseína (Fe-ASP) poderá surgir como uma opção mais tolerável e com resultados não-inferiores a sulfato ferro para pacientes com anemia por deficiência de ferro

Escrito por Germano Glauber de Medeiros Lima

Anemia por deficiência de ferro continua sendo a causa mais comum de anemia no mundo, como resultado de aumento de necessidade de ferro corporal (infância, gestação), baixa ingesta de ferro, redução de absorção, perdas sanguíneas crônicas, entre outras causas.

A despeito da existência de formulações endovenosas para rápida reposição de estoques de ferro, a suplementação oral de ferro ainda é a base para o tratamento da anemia por deficiência de ferro, sendo o sulfato ferroso seu maior representante. No entanto, as principais limitações do tratamento são efeitos colaterais gastrointestinais observados em quase 40% dos pacientes, entre eles: desconforto gástrico, náuseas, vômitos e constipação, causados devido à oxidação do ferro no estômago pelo fluido gástrico ácido, transformando-o em sais insolúveis. Faz-se, então, necessário o desenvolvimento de formulações mais bem toleráveis e efetivas de ferro oral.

Uma nova formulação oral de ferro conjugado com N-aspartil-caseína (Fe-ASP) (Omalin®, Uni-Pharma) foi estudada no ensaio clínico randomizado de fase 4 ACCESS, duplo-cego, duplo simulado, unicêntrico. Os pacientes foram randomizados na proporção de 1:1 para grupos duplo-cegos e tratamento duplo simulado com sulfato ferroso oral (FeSO4) ou Fe-ASP a cada 12 horas, por 12 semanas. Participantes incluídos tinham hemoglobina inferior a 10 g/dl, diminuição da contagem de glóbulos vermelhos e ferritina inferior a 30 ng/ml; pacientes com um histórico de malignidade foram excluídos.

O desfecho primário do estudo foi a não inferioridade do aumento da hemoglobina (Hb) basal com uso de FeSO4 ou Fe-ASP após as primeiras 4 semanas de tratamento. Desfechos secundários do estudo foram as diferenças entre os dois grupos em contagem absoluta de reticulócitos, hemácias, Hb, VCM e HCM, mudança nos sintomas de fadiga, alteração de exame físico, hepcidina e ferritina circulantes; e na incidência de efeitos colaterais gastrointestinais.

Entre maio de 2018 e outubro de 2020 60 pacientes foram randomizados (30 em cada grupo), porém em virtude de retiradas de consentimento, falta de eficácia e necessidade de uso de ferro endovenoso, 6 pacientes foram retirados do estudo precocemente em cada grupo. 

Na semana 4 de seguimento a alteração média da Hb foi de 0,76 g/dl no grupo FeSO4 e de 0,83 g/dl no grupo Fe-ASP (p: 0,876). Os pacientes do grupo Fe-ASP experimentaram uma redução no número de sinais de exame físico relacionados à anemia ferropriva na semana 4, como palidez, fadiga e glossite. No entanto, não foram encontradas diferenças estatísticas entre os dois grupos em nenhum dos resultados de fadiga relatados pelo paciente e de eventos adversos gastrointestinais na semana 4 ou na semana 12, atingindo assim o objetivo do ensaio de não-inferioridade.

O estudo em análise teve diversas limitações, entre elas o baixo número de pacientes incluídos, o fato de ser unicêntrico, e a idade mais elevada dos pacientes no estudo, o que pode ter subestimado o efeito das medicações em populações mais jovens como gestantes. Outro fator limitante foi a posologia utilizada (pacientes recebiam as medicações duas vezes ao dia), já que estudos mais recentes mostram que a melhor posologia para reposição de ferro oral é com o uso da medicação uma vez ao dia ou até a cada 48 horas, dado o conhecido efeito de aumento de hepcidina causado pela reposição de ferro, o que atrapalha a absorção intestinal do mesmo. 

Apesar das limitações, o ensaio ACCESS mostrou que a nova formulação de Fe-ASP foi não-inferior à suplementação oral tradicional de ferro com FeSO4 para atingir o objetivo primário, isto é, o aumento da Hb basal. Estudos mais robustos, prospectivos, e com posologia adequada são necessários para uma melhor avaliação dessa nova formulação.

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