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Terapia com luspatercept em pacientes com β-talassemia dependente de transfusão

Resultados do estudo de fase 3 BELIEVE demonstram que a terapia com luspatercept em pacientes com β-talassemia dependente de transfusão reduziu a carga transfusional significativamente, além de terem sidos relatados poucos eventos adversos que levaram à descontinuação do tratamento. 

Escrito por: Bárbara Yasmin Garcia Andrade Revisado por: Guareide Carelli

As β-talassemias são um grupo de distúrbios monogênicos hereditários da hemoglobina que representam um fardo substancial para a saúde global. Este distúrbio resulta na síntese defeituosa da cadeia beta (β) da hemoglobina A do adulto e causa uma proporção desequilibrada de alfa (α)-globina para β-globina.1,2 A marca registrada da β-talassemia é a eritropoiese ineficaz, hemólise periférica e subsequente anemia. A dependência de transfusão tem sido um fator essencial na caracterização dos vários fenótipos de talassemia e sua gravidade.2 Clinicamente, a doença pode ser classificada como dependente de transfusão ou não dependente de transfusão. Pacientes com β-talassemia dependente de transfusão apresentam-se na primeira infância e precisam de transfusões regulares de hemácias para manter níveis adequados de hemoglobina.1

As complicações da β-talassemia surgem principalmente devido à própria anemia e à sobrecarga de ferro tipicamente observada nesses pacientes.3 Apesar da disponibilidade da terapia de quelação de ferro, muitos pacientes com β-talassemia dependentes de transfusão ainda apresentam complicações relacionadas à sobrecarga secundária de ferro que pode resultar em falência de órgãos-alvo e morte no início da idade adulta1. A necessidade vitalícia de transfusões de sangue e terapia de quelação de ferro afetam negativamente a qualidade de vida de pacientes com β-talassemia dependente de transfusão. O transplante alogênico de células-tronco hematopoiéticas e a terapia gênica são potencialmente curativos, mas apresentam riscos inerentes e são adequados apenas para uma população limitada de pacientes.1

O luspatercept é o primeiro medicamento modificador da doença para β-talassemia, atualmente aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA em 2019 e pela European Medicines Agency (EMA) em 2020 para pacientes com TDT.3 O luspatercept é uma proteína de fusão recombinante que se liga a membros selecionados da superfamília do TGFβ (fator de crescimento β) e aumenta a eritropoiese em estágio avançado1. Em um estudo de fase 2, aberto, variando a dose, a carga transfusional (o número total de unidades de hemácias transfundidas) durante qualquer intervalo de 12 semanas foi reduzida em pelo menos 20% desde o início em 26 de 32 pacientes com β-talassemia dependente de transfusão (81%) que receberam luspatercept na dose de 0,60 a 1,25 mg por quilograma de peso corporal.4 Em 2020 foi publicado no The New England Journal of Medicine os resultados do estudo de fase 3 BELIEVE1, que avaliou a eficácia e a segurança do luspatercept em adultos com β-talassemia dependente de transfusão.

O estudo em questão foi randomizado, duplo-cego, de fase 3, no qual os pacientes adultos com talassemia β dependentes de transfusão foram designados em uma proporção de 2:1 para receber o melhor tratamento de suporte mais luspatercept (em uma dose de 1,00 a 1,25 mg por quilograma de corpo peso) ou placebo por pelo menos 48 semanas. O endpoint primário do estudo foi a porcentagem de pacientes que tiveram uma redução na carga transfusional de pelo menos 33% desde o início durante as semanas 13 a 24, além de uma redução de pelo menos 2 unidades de hemácias durante esse intervalo de 12 semanas. Os demais endpoints de eficácia avaliados incluíram reduções na carga de transfusão durante qualquer intervalo de 12 semanas e resultados de estudos de ferro.

Um total de 336 pacientes receberam a intervenção designada e foram incluídos na população de segurança do estudo (223 pacientes no grupo luspatercept e 109 no grupo placebo). A idade média dos pacientes na população com intenção de tratar foi de 30 anos; 30,7% tinham um genótipo β00 e 57,7% haviam sido submetidos a esplenectomia. Luspatercept ou placebo foi administrado por uma média de aproximadamente 64 semanas em ambos os grupos. A porcentagem de pacientes que tiveram uma redução na carga transfusional de pelo menos 33% desde o início durante as semanas 13 a 24 mais uma redução de pelo menos 2 unidades de hemácias durante esse intervalo de 12 semanas foi significativamente maior no grupo luspatercept do que no grupo placebo (21,4% vs. 4,5%, P <0,001). Durante intervalo de 12 semanas, a porcentagem de pacientes que tiveram uma redução na carga transfusional de pelo menos 33% foi maior no grupo luspatercept do que no grupo placebo (70,5% vs. 29,5%), assim como a porcentagem daqueles que tiveram uma redução de pelo menos 50% (40,2% vs. 6,3%). A diferença média nos níveis de ferritina sérica entre os grupos na semana 48 foi de -348 μg por litro (IC95% -517 a -179) a favor do luspatercept. Eventos adversos de dor óssea transitória, artralgia, tontura, hipertensão e hiperuricemia foram mais comuns com luspatercept do que com placebo.

Os autores do trabalho concluem que porcentagem de pacientes com β-talassemia dependente de transfusão que tiveram redução na carga transfusional foi significativamente maior no grupo luspatercept do que no grupo placebo, e poucos eventos adversos levaram à descontinuação do tratamento, o que confirma o potencial de luspatercept como ótima opção terapêutica para β-talassemia dependente de transfusão.

Referência: 

1 – CAPPELLINI, M. Domenica et al. A phase 3 trial of luspatercept in patients with transfusion-dependent β-thalassemia. New England Journal of Medicine, v. 382, n. 13, p. 1219-1231, 2020.

2 – MUSALLAM, Khaled M. et al. Non-transfusion-dependent thalassemias. haematologica, v. 98, n. 6, p. 833, 2013.

3 – LONGO, Filomena et al. Ineffective erythropoiesis in β-thalassaemia: key steps and therapeutic options by drugs. International journal of molecular sciences, v. 22, n. 13, p. 7229, 2021.

4 – PIGA, Antonio et al. Luspatercept improves hemoglobin levels and blood transfusion requirements in a study of patients with β-thalassemia. Blood, The Journal of the American Society of Hematology, v. 133, n. 12, p. 1279-1289, 2019.

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