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Adição de quizartinibe ao tratamento de leucemia mieloide aguda FLT3-DIT-positivo recém-diagnosticada melhora a sobrevida global

Estudo QuANTUM-First mostra eficácia e segurança do agente de terapia direcionada quizartinibe adicionado à quimioterapia, com ou sem transplante alogênico de medula-óssea, seguida de monoterapia para pacientes de LMA com mutação FLT3-DIT-positivo

Escrito por: Samara Alves

Revisado por: Guareide Carelli

Um estudo com o agente de terapia direcionada quizartinibe trouxe avanços significativos para pesquisas de leucemia mieloide aguda (LMA), um tipo de câncer comum que afeta a medula óssea, agressivo e frequentemente associado a um prognóstico desfavorável. Na LMA, as células-tronco mieloides, responsáveis pela produção de células sanguíneas, sofrem mutações genéticas que levam a uma multiplicação descontrolada. Essas mutações ocorrem de maneira heterogênea, exigindo a estratificação por risco para guiar as decisões terapêuticas para cada paciente. Uma proteína receptora alocada na membrana celular, conhecida como FLT3 (FMS – fator estimulador de colônia de macrófagos – tyrosine kinase like) é frequentemente afetada, com cerca de 25% dos pacientes recém-diagnosticados com LMA apresentando mutações do tipo Duplicações Internas em Tandem (FLT3-DIT). Essas mutações tornam a FLT3 constitutivamente ativa, contribuindo para a proliferação e sobrevivência da LMA. Pacientes com LMA e FLT3-DIT-positivo apresentam maior risco de recorrência e menor sobrevida global em comparação a outros tipos de mutações em FLT3.

O tratamento convencional para a LMA começa com quimioterapia na fase de indução, visando alcançar a remissão da doença ao eliminar a maior parte das células doentes. Isso é seguido por uma fase de consolidação para restaurar as células saudáveis e destruir células doentes remanescentes. Durante a consolidação, o transplante de medula óssea, geralmente alogênico (usando células-tronco de um doador) pode ser realizado. Além disso, estudos com agentes de terapia direcionada estão progredindo para inibir a atividade da FLT3 nas células doentes. Por exemplo, o estudo RATIFY introduziu o midostaurin, um inibidor de FLT3 primeira geração, aprovado em 2017 pela US Food and Drug Administration (FDA) e pela European Medicines Agency (EMA) para uso combinado com quimioterapia. No entanto, devido a sua falta de especificidade, o Midostaurin bloqueia outras proteínas receptoras de tirosina quinase, limitando sua eficácia principalmente em monoterapia para LMA FLT3-DIT-positivo recorrente. Os inibidores de FLT3 de segunda geração, como o quizartinibe, oferecem maior seletividade terapêutica. O quizartinibe foi investigado no estudo QuANTUM-First, um ensaio clínico de fase III, randomizado, duplo-cego e controlado por placebo. 

Financiado pela Daiichi Sankyo e publicado na Lancet, o estudo QuANTUM-First mostra a eficácia e segurança do quizartinibe em quatro fases de tratamento ao longo de três anos para pacientes com LMA recém-diagnosticada e mutação FLT3-DIT-positivo. Destaca-se que esse foi o primeiro estudo com inibidores seletivos de FLT3 a incluir pacientes com mais de 60 anos de idade (idade variando de 18 a 75 anos), uma faixa etária frequentemente afetada pela LMA. 

Dos 539 pacientes, metade foi randomizada para quizartinibe e a outra metade para placebo. A fase 1 consistiu em um ciclo de quimioterapia de indução 7 + 3, sendo 7 dias de citarabina e 3 dias de um agente antracíclico. No oitavo dia, os pacientes começaram a tomar comprimidos de quizartinibe ou placebo por 14 dias. Após atingirem a remissão completa (pode ter sido alcançado com mais de um ciclo de indução), 192 dos 268 pacientes (72%) no grupo quizartinibe e 176 dos 271 pacientes (65%) no grupo placebo avançaram para a fase 2, envolvendo a consolidação com citarabina e quizartinibe (ou placebo), transplante alogênico de medula óssea, ou citarabina e quizartinibe (ou placebo) seguidos de transplante alogênico de medula óssea. Ao todo, 348 pacientes (65%), sendo 173 no grupo quizartinibe e 175 no grupo placebo, seguiram para a fase 3, de continuação com quizartinibe ou placebo, finalizando com a fase 4 de acompanhamento de longo prazo. 

Os resultados indicaram uma melhora na sobrevida global, evidenciada por uma extensão média de 16,8 meses na sobrevida global com o uso do quizartinibe. Isso representa uma diferença significativa comparada ao placebo com 31,9 meses (95% IC 21,0 – não estimável [NE]) para quizartinibe contra 15,1 meses (13,2–26,2) para placebo, além de uma redução substancial no risco de morte (HR 0,78, IC 95% 0,62–0,98). Houve também melhorias clinicamente relevantes na sobrevida livre de recaída, na redução da incidência cumulativa de recaída e no aumento da duração da remissão completa. Por exemplo, a duração mediana da remissão completa foi maior com quizartinibe (38,6 meses; 95% CI 21,9–NE) em comparação com placebo (12,4 meses; 8,8–22,7) com um HR 0,62 (0,45–0,86). 

Para pacientes em remissão completa após a indução, a sobrevida livre de recaída mediana foi três vezes maior com quizartinibe (39,3 meses; 22,6– NE) em relação ao placebo (13,6 meses; 9,7–23,7), com uma significativa redução de recaídas ou mortes favorecendo o quizartinibe (HR 0,61, IC 95% 0,44–0,85) mantendo uma diferença distinta nas curvas de remissão completa por até três anos. Além disso, houve uma diminuição de 12 pontos percentuais na incidência cumulativa de recaídas em 24 meses com o quizartinibe em comparação ao placebo, sugerindo a capacidade do quizartinibe de prevenir ou atrasar recaídas. Os benefícios de sobrevida a longo prazo oferecidos pelo quizartinibe podem ser atribuídos, em parte, a uma redução precoce e mais acentuada na carga mensurável de doença residual FLT3-DIT em comparação ao placebo.

O quizartinibe apresentou um perfil de segurança comparável ao esperado em pacientes recém-diagnosticados com LMA, que receberam quimioterapia padrão ou quimioterapia em combinação com midostaurina. As proporções de pacientes com pelo menos um evento adverso e um evento adverso de grau 3 ou pior foram semelhantes nos grupos quizartinibe e placebo, embora eventos adversos graves tenham ocorrido com mais frequência no grupo quizartinibe, assim como eventos associados a ajustes de dose. Os eventos adversos de grau 3 ou 4 mais comuns (ocorrendo em ≥10% dos pacientes) foram neutropenia febril, hipocalemia e pneumonia em ambos os grupos, e neutropenia no grupo que recebeu quizartinibe. 

Em resumo, pode-se afirmar que o quizartinibe demonstrou eficácia, especialmente na melhoria da sobrevida global em adultos com idades entre 18 e 75 anos, e apresentou um perfil de segurança aceitável, emergindo como uma nova opção de tratamento para pacientes adultos recém-diagnosticados com LMA e mutação FLT3-ITD positivo.

Referências:

Erba HP, e. a. (2023). Quizartinib plus chemotherapy in newly diagnosed patients with FLT3-internal-tandem-duplication-positive acute myeloid leukaemia (QuANTUM-First): a randomised, double- blind, placebo-controlled, phase 3 trial. Lancet, 401, 1571-1583.

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